Fran Pacheco (R.I.P)
Antes de mais nada, preclaro leitor, uma coisa tem
que ficar bastante clara. Quando eu falo de História não me baseio, como
fazem os acadêmicos de plantão, em relatos de tataranetos, livros
mofentos, ou no mais puro chute. Não, nada disso. Eu estava lá.
Estava, quando o governador mulato-maluco-beleza
Eduardo Ribeiro (“O Pensador”) detinha-se melancólico, com seu cavalo
parado à beira do Igarapé da Cachoeirinha.
O negócio é que para sair do Palácio do Governo,
ali na Praça D. Pedro I (atual zona do baixíssimo meretrício) e chegar
nos arrabaldes da Cachoeirinha, só pegando uma catraia. A cavalo, nem
pensar. Isso pelos idos de mil oitocentos e noventa e pouco.
Ganhei muito dinheiro naquela época. Libras (do
tipo esterlinas) de uns trouxas ingleses na mesa de bilhar do Hotel
Cassina. A coisa mais fácil do mundo é ganhar de bêbado no bilhar. E meu
organismo era imune a várias doses de absinto e gim.
Meus negócios eram sortidos e, em geral, controversos.
Eu era, além de anarquista, uma espécie de lobista avant-la-lettre
desses súditos da Rainha Vitória (e a véia não morria). Sabia que o
Governador queria ordem e progresso, e o numerário era tão farto que
acendia até charutos (eu vi).
Com a palavra, Ribeiro, na abertura do anno legislativo de mil oitocentos e noventa e pouco: “Posso affirmar que os recursos de nosso Estado são inexgottaveis!”
“Então, Excelência”, eu dizia, “somos os caras
certos para resolver o seu problema. Quer ligar o Centro àquele cafundó
chamado Cachoeirinha? Façamos a Ponte, pois!”
Nesses momentos, ele entrava em um de seus surtos e
imaginava não uma ponte, mas uma rede de túneis. Túneis debaixo dos
igarapés. Queria túneis com marias-fumaças passando por baixo de tudo,
tal e qual o metropolitano de Londres. Eduardo Ribeiro é hoje nome de
avenida e de hospício.
Entre um delirium e outro eu o convenci a
fazer a Ponte Metálica que até hoje está lá. Sugeri batizá-la de Ponte
Mikhail Bakunin. Entenderam Bacuri. Batizaram de Benjamin Constant, um
porco positivista que era ídolo dos milicos da época (Eduardo incluso).
Bem, deu pra ganhar um bom dinheirinho. E qual não
foi a alegria dos cidadãos manauaras no dia da inauguração! Manáos já
curtia uma inauguração de elevados desde sempre.
E qual não foi a alegria de Eduardo Ribeiro naquela
mesma noite, passado o festejo, quando enfim teve resolvido o grave
problema e pôde atravessar a ponte a cavalo, para encontrar-se com sua
fogosa amante, que morava do outro lado.